segunda-feira, 31 de julho de 2023

PALAVRAS E AÇÕES

 

De que te serve mudares as tuas palavras se não mudares também as tuas ações?

Podes ou não mudar as tuas palavras, mas tens de mudar as tuas ações!

Esforça-te para que as tuas ações sigam as tuas palavras.

Exceto para o escritor, as palavras não são ações.

Muda as tuas ações, as tuas palavras irão atrás.

Podes mudar as tuas ações em silêncio.

As tuas ações não são as tuas palavras.

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As tuas ações não são as tuas palavras.

Podes mudar as tuas ações em silêncio.

Muda as tuas ações, as tuas palavras irão atrás.

Exceto para o escritor, as palavras não são ações.

Esforça-te para que as tuas ações sigam as tuas palavras.

Podes ou não mudar as tuas palavras, mas tens de mudar as tuas ações!

De que te serve mudares as tuas palavras se não mudares também as tuas ações?

domingo, 30 de julho de 2023

EM LOUVOR DA SIMPLIFICAÇÃO

 simplificar é

escolher o silêncio em vez de falar

aceitar que o todo está em toda a parte

recusar o talvez que pode ser sim ou não

preferir a reta que tolera a curva


simplifique-se então

que quanto mais se simplifica

mais simples fica


mas cuidado

ser simples é sempre

muito complicado

quinta-feira, 27 de julho de 2023

NOVE MILHÕES DE BICICLETAS EM PEQUIM


Rarefazer a mágoa

é despejar o mar

num copo de água

 

triste tarefa

o mar não diminui

só aumentando o copo

 

já não sei o que digo

tudo o que me interessa

é fugir ao perigo

 

escrever pouco a pouco

linha a linha este poema

poema dilema

 

poema que cresce

tanto mais quanto

mais rui e rui e rui e rui

 

até ser António Maria

que mais do que isto

eu não queria

quarta-feira, 26 de julho de 2023

POEMA EM FORMA DE E

Nem sempre fui quem quis

nem sempre fui muito feliz 

no entanto

acreditem em mim

se quiserem

muitas vezes fui muito feliz

muitas vezes fui  quem quis

terça-feira, 25 de julho de 2023

segunda-feira, 24 de julho de 2023

EXERCÍCIO

 "Escolha um poema que represente, para si, a liberdade, o convite à mudança, ou à viagem. Recite-o em voz alta, enquanto caminha. A cada sílaba faça corresponder um passo. Durante este exercício relaxe as costas, inspire e expire de maneira confortável. Vá repetindo o texto até se sentir embalado e ficar quase hipnotizado pelas palavras."

Jacques de Coulon

UMA HISTÓRIA DE AMOR


 Do meu primeiro amor

recordo apenas a cor

do seu cabelo e o beijo

que trocámos numa distante

festa de garagem

 

Depois outros se seguiram

e se confundiram

mas de todos eles

me recordo

um pouco

como de um rio a correr

para o mar

 

E o último será

o mais magnífico e arrasador

amor que não está ainda aí

mas que em breve

muito em breve virá

quinta-feira, 20 de julho de 2023

DA CERTEZA


 

as palavras não têm peso mas, no entanto,

caem em direção ao centro do mistério,

majestosas e enigmáticas,

poderosos habitantes

de um instável

universo

sábado, 8 de julho de 2023

NOITE

 Acordo

Sobressaltado

A noite afiada

como uma espada

pronta para me cortar

de um só golpe

a cabeça

Agarro-me às palavras

Escrevo

terça-feira, 4 de julho de 2023

AS COISAS QUE ME IRRITAM

 irritam-me nos outros tantas coisas

a intolerância a tirania a estupidez...

as mesmas que em mim me irritam

domingo, 30 de abril de 2023

...

 Acredito nas palavras com a mesma intensidade com que desconfio delas. É por isso que escrevo, é por isso que me calo.

Acredito nas pessoas com a mesma intensidade com que desconfio delas. É por isso que me aproximo das pessoas, é por isso que me afasto delas.

Acredito em mim com a mesma intensidade com que desconfio de mim. É por isso que constantemente me afirmo, é por isso que constantemente me nego.

Onde é que isso me deixa? Onde é que isso me leva?

A raiva e a inquietação estão sempre presentes em mim, onde quer que eu esteja, onde quer que eu vá. Felizmente, o entusiasmo e a fé também me acompanham.

Fé em quê? Fé em quem? Fé em mim mesmo e na natureza humana. 

Por isso sigo em frente, como este texto, penosamente, alegremente, até atingir um fim que não é mais do que uma pausa.

 

UM MONÓLOGO É SEMPRE UM DIÁLOGO, UM DIÁLOGO É SEMPRE UM MONÓLOGO

segunda-feira, 24 de abril de 2023

 GOSTO DE POEMAS BREVES

 

 

 

 

gosto de poemas
com sombras longas
e espessas

 

*

 

gosto de poemas
que se acendem
como isqueiros

 

*

 

gosto de poemas
que desferem raios
sem aviso

 

*

 

gosto de poemas
que se riscam
como fósforos

 

*

 

gosto de poemas

que explodem

(n)o branco da folha

 

 

*

 

gosto de poemas

que se (con)fundem

com o branco da folha

 

*

 

gosto de poemas

que voltam sempre

ao princípio

 

 

*

 

gosto de poemas

que nunca acabam

de se dizer

 

* * *

 

para dizer muito

cala-te o mais possível

(...)

domingo, 19 de março de 2023

Híbrido

 Desafogo pela manhã

 

Aqui e agora,

o que preciso de saber

além de sentir?

 

As coisas são o que

são e valem o que valem,

triste truísmo.

quarta-feira, 15 de março de 2023

Haiku

 Haiku


Primeiro, acalma-te.

Depois, fica assim

para o resto da vida.


Ron Padgett, Poemas Escolhidos


sexta-feira, 10 de fevereiro de 2023

Pôs-se bonita e morreu. (continuação)

 Perante a frase em causa, o que se pode pensar? Que caminhos podemos seguir?

Matou-se? Mataram-na? Morreu de outra causa natural? Ou morreu será metafórico? Desfaleceu? Perdeu a vontade?


Tento de novo!


Pôs-se bonita e morreu

Ficou por ali, sem qualquer vontade de sair, completamente inerte, e muitas horas se passaram até que, digamos assim, ressuscitou.


Pôs bonita e morreu

Tudo aconteceu sem qualquer relação de causa e efeito que não seja a estupidez e a grosseria de alguns homens, que aparentemente nunca tiveram mães.


Pôs bonita e morreu

Estava linda de morrer, é verdade, mas a beleza não é causa de morte, e o médico concluiu que fora um ataque cardíaco, tão fulminante quanto a sua beleza.


Ao ler esta esta notícia achei que tinha tudo a ver com a frase.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2023

Pôs-se bonita e morreu

 A frase de uma amiga desperta-me a vontade de escrever. É uma frase pequena, um verdadeiro micro conto, que se basta a si mesma, se a aceitarmos na sua brevidade e penetrarmos as portas que se abrem. A pensar em quem seria essa mulher e qual seria a sua história, escrevi três pequenos textos que me surgiram de repente. Fico à espera que a pequena e promissora frase me continue a seduzir e, quem sabe, escreva um romance com esse título.


PÔS-SE BONITA E MORREU

(Não há duas sem três)

 

Primeira tentativa

 

Vestiu-se de vermelho vivo,

ergueu-se em direção ao sol

num passo de dança e

caiu indefesa no chão.

 

Segunda tentativa

 

Pôs-se bonita e morreu, assim, sem mais menos,

ninguém compreendeu porquê.

Muitos se interrogaram porque morrera, assim,

de repente, sem mais nem menos,

mas ninguém se interrogou porque se

pusera bonita, porque se penteara

demoradamente, porque arranjara as sobrancelhas,

porque pintara os olhos e os lábios com extremo

cuidado. Esperaria um amante, esperaria a morte?

Todos sabemos que a morte é um amante exigente.

 

Terceira tentativa

 

A autópsia foi clara, a morte tivera causas naturais. O investigador encarregado do caso, pasmou de mistério e de paixão e a sombra funesta daquela morte nunca mais o abandonou. Guardou, na carteira, até ele próprio morrer, de velhice e de tédio, a fotografia daquela mulher meticulosamente arranjada, que a morte tornara ainda mais bela, e contemplava-a muitas vezes. “Pôs-se bonita e morreu.”, dizia sempre, em jeito de oração, e às vezes acrescentava, como num eco, “Já não queria saber do amor”.

Cruzeiro Seixas

 Ouvir.